Uma carta na brisa para meu terapeuta (ou será para meu amigo)

Eu aguardo alguma coisa chegar, mas não sei exatamente o que é. De repente, minha mente parece diminuir e todos os pensamentos fogem. Sinto um leve formigamento nos dedos enquanto digito. Meus dentes estão mais apertados que o normal, rangendo uns contra os outros. Meu coração bate rápido, o sangue que pulsa na garganta queima. Quero salvar o mundo, mas também desejo só ir deitar com um livro nas mãos e me perder em um universo paralelo e único. Quero respirar enquanto corro para não perder o próximo trem. Essa sensação é maravilhosa, o calor que transpassa o corpo, pulsos acelerados, mãos ágeis. Então, por que esse pensamento irritante de que "existe algum perigo"? Por que sinto o sangue tão quente que parece sufocar, e a boca fica seca de um jeito indecente? Nos últimos 5 minutos, enquanto escrevo estes parágrafos, tive várias ideias, indo e vindo, umas contra as outras, se misturando por todas as direções. Parece aqueles vídeos do Instagram com carros vindo de várias ruas em um fluxo perfeitamente alinhado. Como será que produzem esses vídeos? Porque não há condições alguma de serem reais. Alguém, uma única pessoa, iria bater e estragar tudo (se eu estivesse lá, já sabemos quem seria).

Estou esperando algo... É interessante o que estou fazendo. Decidi digitar o que vem à minha mente da maneira mais rápida que posso. Tudo que consigo mapear nos meus pensamentos, estou escrevendo bem rápido. Já ganhei alguns concursos de digitação, sou dessa época... digitava rápido... Com esse estudo aqui, quero saber se digito mais rápido que um pensamento. Sou minha própria cobaia. Mas não é para isso que estou escrevendo. Só quero escrever um pouco, eu tinha esse hábito antes. Sentava e escrevia por horas. Já criei muitas histórias. Algumas eram muito boas e eu gostava do que escrevia, ainda gosto na verdade. Seja por presunção ou não, meus textos e, principalmente, minhas poesias são melhores que muitas por aí. Só que soube disso tarde demais, mas o fato é que eu gostava e acho que era só eu mesmo que gostava... Queria ter sido para algum adolescente qualquer do interior o que alguns autores foram para mim. Eu gostava de ler... me conectava tanto com os livros, me apaixonava toda vez.  Eu sempre queria estar lá naquela história, resolvendo aqueles mistérios. Sendo o assassino. Eu sempre quis, lendo os livros da Agatha Christie, ser todos os personagens,  menos o Hastings e o morto. O Hastings, sempre imagino sendo o Martin Freeman - acho que por causa de Sherlock - e ele está, incrivelmente, sempre errado. Todas as vezes ele estava ERRADO! Mano, ele não servia para isso. Agatha querida, você não viu que você, rainha da literatura, deusa perfeita da lógica e dedução, não havia deixado uma opção certa, mulher, pela estatística... Eu li 72 dos 86 livros e em nenhum Hastings estava certo. Pesquisei no Google e no Chat GPT, agora para colocar aqui, mas não souberam dizer... Nenhuma vez! É sacanagem... qualquer dia eu vou escrever uma fanfic só pra colocar o Hastings como o certo da história.

O mercado livre me interrompeu, veio entregar uma encomenda, acho que era isso que estava esperando... ou não! Já que a sensação permanece.  Meu raciocínio se foi, agora preciso retomar. Parei para preparar um drink, pegar algo para comer... estou com os dentes travados, querendo comer algo. Pensei em muitas coisas, mas se eu for tentar resumir aqui, vai virar um pandemônio. Também não vou ler tudo que já escrevi para não cair na tentação de corrigir e melhorar o texto. Não! Deixo os pensamentos virem, depois você diz se faz sentido, afinal você é o especialista. Pesquisei no GPT os filmes do Martin Freeman. A série do Sherlock é muito boa. Ah! Eu já disse por que não gostaria de ser o Hastings e o morto porque, enfim, o morto é só o assunto, não é? Eu não gosto de ser o assunto.

Eu gostava de escrever. Lembro-me de uma vez em que, junto com a lição de casa, entreguei uma folha de caderno com um desenhozinho de paisagem e uma poesia que chamei de "Dias de Chuva". A professora nem sequer viu, apenas deu um C "de certo" em todas as folhas e me devolveu. A poesia era romântica, com rimas de "ão" com "ão" para ficar musical. E desenho de lápis de cor no fundo. O mais engraçado é que, se minha mente não está inventando coisas para preencher as lacunas, lembro-me de ter sentido um alívio. Talvez tenha sido porque bateu uma vergonha de a professora expor aquilo para a turma e eu perder a pose de "marrenta" para alguém que escreve "cartas de amor". Enfim, não era para eu estar fazendo nada disso. Olha o tempo que estou perdendo. Tinha feito uma lista de tarefas e não fiz nada da lista... Estou aqui... surtando? Será que estou? Ou sou (surtada)? Ah, não sei. Não importa. Não era para estar fazendo isso, escrevendo palavras desconexas, para pensamentos desconexos, mas está divertido. É como se estivesse conversando com um amigo. Eu não sei... sinto como se estivesse conversando com duas pessoas agora. Com meu psicótico, Flávio. Com meu amigo, Ioshim...

Me veio um pensamento muito interessante agora. Bem, você nem vai ler isso, então está tranquilo. Mas está divertido porque não estou pensando para escrever, não estou preocupada com erros ou coerência. Estou apenas deixando fluir. Acho que estou um pouco embriagada. Imaginando o Psicótico me dando bronca... já estou me preparando, e eu me acostumo muito fácil a apanhar. Então, Flávio, se você estiver vendo isso, eu e meu amigo Ioshim (Washington, mas quem escreve esse nome certo toda vez?) nos referimos aos nossos queridos terapeutas como "psicóticos". Achei isso muito bom porque, na verdade, cá entre nós, que nossa conta está em dia: vocês não fazem ideia do que estão fazendo, né? É na sorte! Tipo o João Bidu fazendo mapa astrológico do horóscopo lá. Se você olhar pelo ponto de vista da lógica (eu posso provar, juro - eu poderia ter sido um gênio), tem 12 signos e 4 fases da lua, então o cara só precisava escrever 12 frases dizendo que: ou você está fodido na conta bancária, ou você é corno, ou está desempregado, ou vai morrer alguém da sua família e te deixar herança, ou você vai encontrar um grande amor, ou está bom para ir à praia ou seu cabelo vai cair... enfim, vários "ou"... e dizer isso de 12 formas diferentes, para cada signo. Um jogo de palavras. Vamos criar um podcast de horóscopo, o Chat GPT faz isso com dois cliques e a pergunta certa, com minha teoria de ver se não seremos do João Bidu dessa geração. Então os psicóticos são iguais aos astrólogos, tipo Raul Seixas, vocês não fazem ideia de como lidar com tanta regra alheia, mas jogam uma palavra aqui, outra ali, acertam hoje e garantem a sessão da semana que vem, erram e falam que precisam de mais confiança... Enfim, que profissão estranha. Às vezes, eu fico analisando vocês também. Não é tão difícil e eu já li Freud, já peguei muita viagem, como hoje, eu num divã com Floyd (igual do da tirinha) e ele me chamando de histérica (porque ele só falava isso, cara chato. 08 ou 09 publicações para ficar enchendo o saco que mulher é histérica. Nunca deve ter feito uma mulher gozar e fica nessa).

Enfim, Freud é um bocão e não tem como vocês não ficarem neurados com as coisas. É muito doido. Vocês não fazem ideia do que estão fazendo... Ioshim, se você estiver lendo isso, então você já sabe que não é a primeira vez, já está acostumado. Mas o que eu estava dizendo lá atrás é que, no dia em que a professora deu um C no meu poema florido sem nem olhar para ele, eu percebi que se eu mostrasse o 
"para casa" de hoje de cabeça para baixo, ganharia outro C, a professora não lia... e eu não precisava fazer todos os "para casa". Poderia fazer minha lição num dia e trocar a outra por merenda para alguém que não tinha feito. Eu realmente pensava essas coisas... achava que eu poderia ser um gênio porque conseguia pensar mais que a galera. Eu percebia isso, crianças lentas da porra, para fazer uma tabuada tinham que pensar... mas depois de um tempo me disseram que era só falta de clonazepam mesmo. Já acharam um rótulo. Minha mãe nunca quis saber. A preocupação dela era ir para a igreja, hoje olho com dó para a situação porque era o social que ela tinha. Era quando ela saía da aba do marido escroto (no caso meu pai) e podia ver outra pessoa. E tal... mas tinha que me arrastar? Eu só queria ficar em casa lendo As Brumas de Avalon ou Harry Potter... eu só queria ficar na minha. Não podia levar o livro para a igreja, tinha que ir, levantar no louvor, bater palma etc... etc...

Minha mãe é uma incógnita para mim. Queria colocá-la no meu divã com Freud só para ouvir de onde vem tudo... enfim... estou cansando. Peguei uma brisa boa hoje. Só devia ter feito minhas tarefas. Queria ter escrito um livro que fosse a âncora de alguém. Teria sido muito massa. Mas não podia... Não sei por que a lembrança da professora veio à mente hoje. Isso faz tanto tempo! Aprendi ali como ter lanches todos os dias da escola. Era legal. Levava meu "para casa", fazia e no outro dia dava para alguém. No outro dia, fazia o meu mesmo e virava a folha para ganhar os C de dois dias... está vendo que sistema bosta eu criei?

Ioshim, por que você nunca aprendeu a programar? Seu psicótico ainda não respondeu essa? Isso me intriga porque... é tão simples! Você realmente poderia se quisesse um pouco mais... Mas veja bem. Eu fazia 1 folha de dever por dia: 1 para mim, que valia para 2 dias, e nos outros eu fazia uma lição para algum colega da sala. Mas por que não poderia fazer 2 lições por dia, uma para mim + uma para outro colega? Minha mãe sempre mandava eu fazer a lição antes de arrumar a casa. Pelo menos isso, né! Então ela tinha em mente que eu teria 1 folha de lição todo dia. Ela não pegava as folhas, não lia, não acompanhava. Eu passei a ter duas folhas de lição e ninguém notou. Eu já podia comer coxinha da cantina ou comprar um refrigerante todo dia. Mas eu gostava de escrever e estudar, então para mim estava bem. Eu podia ficar no quarto isolada porque estava estudando.

Quando passei para 3 folhas de lição por dia, minha mãe chegou a desconfiar. Ela questionava porque eu tinha tanto dever e lembrava que eu tinha minhas obrigações para fazer. Uma vez eu disse para minha mãe que estava pegando dever a mais para aprender mais coisas. Ela falou: "Suas obrigações - terminar" e pronto. Comecei a chegar em casa, fazer todas obrigações e depois fazer meu(s) para casa. E funcionava, porque não tinha motivo para lembrarem de mim se eu já tinha feito minhas obrigações. Eu ficava no quarto, tocando meu negócio, em paz.

Em outra ocasião, minha mãe questionou novamente por que eu não estava pedindo para sair, e eu disse que estava fazendo a lição. Ela perguntou por que havia tantas folhas de lição. Eu respondi que era porque precisava de reforço, já que não sabia a matéria. Então ela falou que se eu tomasse bomba, ela ia me tirar da escola para eu ir lavar banheiro na casa dos outros. Minha mãe me achava burra. Mas eu não era, e eu sabia disso. Eu sabia, e agora, além da coxinha e refrigerante todos os dias, eu também comprava balas para os meus amigos. No meu negócio tinha pessoas da sexta série (minha série) e da quinta série. Mas expandi até a oitava. Eu fazia trabalhos, lições, copia cadernos... 

E eu podia escrever minha história, agora eu mesma comprei um caderno e um lápis extra e não precisava levar uma surra por ter gasto folha e lápis à toa, e não só com a escola. Eu podia ler em paz, ninguém na biblioteca da escola fazia controle dos livros que saíam de lá. Comecei a pegar livros mais densos para minha idade, tipo Allan Poe, Stephen Hawking - sim, o físico, e os hots da época, como Sabrina, Júlia e etc. Eu podia ler o que eu quisesse, não tinha essa de controle parental não.

Obviamente, na escola, o pessoal notou, né? Não a pedagoga, não a professora, mas a danada da tia da cantina. De repente, ela viu que meus hábitos de consumo mudaram (sempre o capitalismo ferrando com tudo), e a danada acendeu a luz vermelha, sabendo que tinha algo estranho ali. E claro, isso foi parar com minha mãe na escola. Levei uma surra, depois levei outra em casa porque fiz minha mãe perder uma faxina, e mais tarde levei mais uma do meu pai porque eu poderia ter comprado uma lata de óleo pelo menos. Como castigo, os princesos da escola mandaram eu fazer 15 redações com os temas que eles passaram, e ainda falaram com minha mãe que se eu não fizesse, ela ia ter que voltar lá. O melhor castigo pra mim, eu poderia ao menos continuar trancada no meu quarto (que eu dividia com minha irmã, meu irmão e minha vó na época). 

Olha uma oportunidade nova chegando... Flávio, eu realmente pensava desse jeito. Se fosse hoje, eu seria considerada uma positiva tóxica: "Veja pelo lado bom". Eu só precisava de uma suspensão a cada 15 dias e manter a pose de "ela não está melhorando", por parte da escola, junto com a ameaça de "se eu for chamada na escola, você vai ver", por parte da minha mãe. Mas "mãe, se eu não fizer todas as lições, eles vão te chamar lá", e eu novamente tinha um mundo de paz. Vez ou outra, eu criava um motim na sala, só para garantir que "estava em supervisão" escolar...

Eu só perdi mais uma vez a chance de criar, porque não tinha mais o caderno e nem como comprar um caderno extra, meu pai confiscou o meu e jogou fora e se usasse os meus da escola viria uma nova bronca. Mas eu podia ler e aprender coisas novas, já valia muito a pena. 

Eu realmente acho que escrevo melhor que muitas pessoas por aí. Tem textos meus que são tão...  diferentes. Não tenho culpa da pessoa não conseguir ser penetrada com minha arte... Meu amigo chama de "fofoca literária", mas os textos dele não têm, nem de longe, metade da emoção dos meus. Poemas de Cera... Mas além de tudo, e vou finalizar porque minha onda passou... ou não escrevo mais porque não tenho para quem dizer, e a escrita, mesmo os poemas, precisa de um leitor, não um leitor como entretenimento, mas aquele para quem foi feito o texto. O protagonista, mesmo indiferente, do resultado. A, como dizem os poetas, inspiração. Não tenho para quem dizer, então não tem porquê escrever ou falar. Será que ainda encontraria uma criança com um livro nos braços que mergulha nesse mundo? As crianças de hoje parecem não serem capazes. Isso seria uma coisa que eu gostaria de preservar, a sensação de fazer um amigo nas páginas de um livro.

Ih, já chega, estou romantizando tudo já. Um pouco bêbada também e ainda com o sangue quente. Dessa vez a pegada foi gostosa, interessante... um devaneio.

Comentários

  1. Perfeito👏🏾👏🏾👏🏾

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  2. Nossa, que texto incrível. Eu literalmente senti uma disputa entre os devaneios literários e a a necessidade provocativa de externalizar e eternalizar cada lembrança. Pra isso servem as memorias, os livros e as viagens no espaço temporal rs. Pra você poder voar perto de onde quer, saindo pra bem longe de onde tentaram te obrigar a ficar

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